A questão da ventilação nas Residências do Cariri

Texto: Luiz Felipe Castro

Um dos inconvenientes de se viver numa região árida como o Cariri são as altas temperaturas devidas ao fato de estarmos perto da linha do equador associada a falta de vegetação advinda da cidade; De modo que, se uma construção não for projetada para tal, pode acarretar num desconforto prejudicial: desconforto, transpiração excessiva, estresse, cansaço…

Há técnicas que podem ser feitas para evitar isso, como projetar grandes sombras, vegetação em grandes áreas para criar um microclima, fontes de água, ventilação natural. Mas a mais simples é o isolamento térmico em conjunto de ar condicionado para climatizar o ambiente. Essa solução, entretanto, costuma ser cara e fora do alcance de muitas pessoas, paredes de isolamento térmico, costumam ter o dobro da espessura e requerem mantas especiais o que encarece bastante a construção e o ar condicionado, para um bom resultado, precisa ficar ligado por longos períodos de tempo gastando muita energia que ainda é proporcional ao tamanho da área a ser climatizada (e venhamos e convenhamos, com a energia no preço que está e do que a inflação já corroeu nosso dinheiro, isso não pode ser vantajoso para ninguém). Aqui focaremos numa ideia muito mais simples, fácil e, pessoalmente, bem mais agradável: Ventilação Natural.

Primeiramente, é preciso entender que a grande maioria das casas da nossa região não foram pensadas para esse clima. Apenas pegamos projetos e construções de outros lugares, e as replicamos aqui. Como resultado, temos essa malha urbana de várias casas geminadas que, apesar de fornecer proteção contra a insolação (no da casa estar no sentido norte-sul), dificilmente permite a renovação do ar interior. Entretanto, mesmo para essas, existem soluções que se bem executadas, podem melhorar bastante a situação.

Residência típica da Cidade de Juazeiro do Norte Fonte: OLX

Residência típica da Cidade de Juazeiro do Norte Fonte: OLX

Com relação a ventilação, é preciso saber que, apesar dos estudos mais aprofundados envolverem diversos cálculos complicados e uma parte da física ainda não dominada por nós (aqui me refiro a turbulências), é possível com apenas algumas noções básicas compreender de forma qualitativa seu comportamento, por exemplo:

1-Para que haja vento, é necessário se ter duas pressões, uma positiva e uma negativa. Em outras palavras, para o ar entrar em um ambiente (local pressão positiva) ele também precisa sair dele (local de pressão negativa). E quanto maior for a diferença de pressão, maior a velocidade do vento.

2-Fatores que podem influenciar essas pressões são: diferença da área de entrada e de saída do vento, se a diferença for muito grande, o ar pode ficar estagnado dentro do ambiente, se a diferença for pequena, é possível aumentar e diminuir sua velocidade; velocidade e direção do vento externo referente a janela de entrada, uma maior velocidade, aumenta a pressão positiva e quanto mais direta for a direção do vento, mais desse pode ser aproveitado; e temperatura, se tivermos uma área muito quente, como uma casa próxima do asfalto ao meio dia, teremos uma alta pressão provocada pela temperatura (para quem não lembra das aulas de química, considerando uma gás ideal: P=nRT/V) já, se tendo o alto de um prédio, longe do chão e bastante ventilado, teremos uma área de baixa pressão tanto pela menor temperatura como pelo efeito Venturi.

Já armado desses princípios, exponho 3 formas de causar ventilação natural, e logo após, uma sugestão para as casas do Cariri.

Técnicas:

  • Ventilação Unilateral: Esse tipo de ventilação se caracteriza por aberturas no mesmo plano. Das três é a menos efetiva, pois por receberem ventos praticamente na mesma direção, mesma velocidade e mesma temperatura, sua diferença de pressão é provocada meramente pelo comportamento inconstante e aleatório de deformidades na massa de ar. Sendo usada apenas em ambientes pequenos e quando outras soluções não são viáveis. Essa técnica é meramente um exaustor para uma lenta renovação de ar.
  • Ventilação Cruzada: Diferente da Ventilação Unilateral, essa se caracteriza pela localização das aberturas de entrada e de saída de ar em planos opostos ou adjacentes, facilitando a circulação do ar. Para nós, consideramos que os ventos vem principalmente do sudeste e por vezes do leste (e portanto fortes candidatos a pressões positivas), é interessante que as aberturas de entradas de vento estejam voltadas nesse sentido. As de saída tanto podem ser em paredes adjacentes, mas sabendo que o ideal é que estejam opostas com o mínimo de obstáculos para atrapalhar a passagem do vento (considerando quer queremos maximizar o vento). Por vezes, não é possível abrir uma janela de saída para fora da residência, nesse caso, é possível uma serie de aberturas entre os ambientes que direciona ao mesmo tempo de ventila toda a residência.

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  • Efeito Chaminé: O esse é causado principalmente pela diferença de temperatura. Como o interior de uma residência costuma ter temperatura maior que a exterior, o ar tende a escapar por cima e entrar por baixo.

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Além de considerar a diferença de temperatura, podemos também contabilizar a velocidade do ar no topo da edificação. O ar em velocidade “arrasta” o ar interior intensificando o efeito (Efeito Venturi). Veja que para esse tipo de técnica exclusivamente, o ideal é que a abertura da “chaminé” fique voltada para o lado oposto da direção dos ventos predominantes, caso contrário, tanto se perde a ajuda do Efeito Venturi como o ar que entre (devido velocidade) fica em conflito com o que sair (devido a temperatura).

Se bem planejado, é possível que um projeto se utilize dessas 3 técnicas (e outras não mostradas aqui, mas consequência dessas básicas) para otimizar o vento. Nesse momento, em importante falar que o excesso também pode ser prejudicial. A norma americana ASHRAE55:2004 estabelece as velocidades 0,15m/s, 0,25m/s e 0,8m/s respectivamente para inverno, verão e verão de 28°C. Para nós, podemos considerar uma média ideal entre 0,5m/s e 2,5m/s. Para mais informações, também tem: ISO7730:1994 e NBR15520:2005.

Agora, visando uma situação mais prática, visando as casas que temos, seguindo o padrão de 5-7m de frente por 15-25 de fundo. Essas casas costumam ser vedadas dos lados, sendo colocado uma área de serviço nos fundos e, percorrendo ela, uma circulação que conecta sala de entrada/garagem, com quartos e cozinhas. Para melhorar a circulação de ar, se propõe 3 aberturas. A convencional claraboia acima da circulação principal, que podem servir como efeito chaminé, janelas amplas para a área de serviço, pois essa será a área de entrada ou saída do ar e, essa última abertura é menos convencional, porém essencial, uma claraboia na fachada. A ideia é tentar fazer uma ventilação cruzada entre a fachada da casa e a área de serviço, a claraboia da circulação é mais uma auxilio para exaurir qualquer ar quente que fique preso. Para casas já construídas, não se pode mais escolher o sentido dela, o que prejudica a eficiência, mas só de se terem duas entradas opostas, já ajuda bastante.

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Foto principal: Cariri Revista